Obá
Mexendo em textos e imagens, revendo diários e metas e reestruturando o blog .... Talvez seja a proximidade das datas: dia da mulher afro latino-americana e caribenha (25 de julho) e dia da mulher africana (31 de julho), me bateu uma vontade de publicar sobre a matriarca de Elekô : Obá, orixá guerreira que tanto admiro!!!
Obá
Não tem homem que enfrente
Obá
A guerreira mais valente
Obá
Não sei se me deixo mudo
Obá
Numa mão, rédeas, escudo
Obá
Não sei se canto ou se não
Obá
A espada na outra mão
Obá
Não sei se canto ou se calo
Obá
De pé sobre o seu cavalo
Não tem homem que enfrente
Obá
A guerreira mais valente
Obá
Não sei se me deixo mudo
Obá
Numa mão, rédeas, escudo
Obá
Não sei se canto ou se não
Obá
A espada na outra mão
Obá
Não sei se canto ou se calo
Obá
De pé sobre o seu cavalo
(As ayabás - Gilberto Gil)
Republico esse texto, pois são poucos os que relatam sobre Obá e esse é um texto MARAVILHOSO, ainda não achei outro melhor para falar dela:
Obá - a líder das Mulheres
Oba
é um dos “orixás femininos” sobre a qual recaiu uma espécie de esquecimento.
Todavia, não obstante este fato, ela goza de enorme significado no universo das
religiões de matriz africana. Muito pouco se tem escrito sobre a mesma, talvez
por ela nos remeter a um mito original que se repete em várias culturas que
fala “de um tempo em que o mundo era governado pelas mulheres.”
Em
alguns terreiros de candomblé que ainda preservam a figura desse principio
ancestral, Obá aparece como uma caçadora. Este fato faz alusão aos primórdios
dos grupos humanos que tinham a atividade coletora como principal meio de
sustento. Pena que ainda hoje quando retomamos esta imagem, logo nos vem à
mente figuras masculinas, contrariando alguns mitos afro-brasileiros que trazem
enfaticamente a presença de mulheres a frente de grupos que mais tarde darão
origem às grandes civilizações. Em todos os mitos preservados no Brasil, Obá
apresenta-se como caçadora ao lado de outras como Oyá e Iewá, daí a sua ligação
direta com Odé, o caçador.
Outra
imagem que reforça a antiguidade do seu culto é a de que tal orixá também é um
rio do mesmo nome que ainda hoje corta uma parte do território iorubá. Conta-se
que, após vários dias de batalha, estando os orixás liderados por Ogum e Oxalá,
fragilizados pela guerra, Obá não se contentando em reunir apenas as mulheres
de seu tempo, convocou todas as fêmeas do mundo animal. Ao ver Obá chegar
rodeada de animais, aquela guerra foi vencida porque os inimigos fugiram de seus
postos. Afirma-se nos terreiros que Obá mantém relações profundas com os
animais, outra imagem antiga preservada do tempo em que os primeiros grupos
humanos acreditavam encantá-los através de seus desenhos. O tempo em que os
caçadores e caçadoras confundiam-se com a própria caça.
O
culto a Obá é ainda hoje cercado de mistério. Mistério velado pelas cores
escuras, representadas pelo vermelho encarnado que compõem seus elementos
rituais nas poucas vezes em que aparece. Em alguns terreiros de tradição jeje
nagô, a cantiga que diz “Obá, líder da sociedade Elekô comanda todas as
mulheres guerreiras”, inicia a seqüência de músicas que dentre outras coisas,
lembra a sua importância como representante das mulheres como caçadora,
chamando para si funções sociais, políticas, culturais e religiosas. Em outras
palavras, Obá, além de desempenhar um papel como desbravadora, cabia a ela
defender o grupo, o protegendo em todos os sentidos, fomentar seu sustento e
garantir a sua integridade política. Os caçadores eram ainda médicos, mágicos,
verdadeiros entes divinos que sabiam que da relação de sua comunidade com os
ancestrais dependia a sua permanência no mundo.
Daí
a expressão: “Obá Elekô”. Elekô, a exemplo de muitas outras sociedades
secretas, era uma espécie de “maçonaria de mulheres”, que dentre outras
funções, zelava pela preservação da relação entre estas e a terra, para alguns
grupos humanos, a grande mãe ancestral. Pena que apenas persistiu dentre nós,
fragmentos de uma história que diz ter sido Obá enganada por uma das mulheres
de Xangô que a teria induzido cortar uma de suas orelhas. Acho mesmo que a
imagem da orelha cortada por Obá neste mito é menos importante do que aquilo
que considero tema principal: o amor. Obá é símbolo do amor, esse princípio
universal que por mais esforço já se tenha feito para traduzi-lo através das
poesias, das filosofias, das religiões e recentemente da ciência, ainda é um
mistério, talvez por ser ele um dos mais divinos.
Gosto
muito da história que diz que certa ocasião muito triste por ter perdido um de
seus filhos, uma mulher adentrou-se na mata e pediu a Obá que o trouxesse de
volta. Adormecida na floresta, a jovem sonhou com sementes que lhes eram
trazidas por um enorme pássaro. Acordada do sono, a mulher foi procurá-las.
Chegando a beira de um rio, mal pode conter a sua alegria ao deparar-se com as
sementes que a noite havia sonhado, ao mesmo tempo em que se deu conta de que,
era ela mesma o pássaro que a noite havia visto em sonho. Das sementes
plantadas pela mulher arrebentou uma planta que se transformou numa árvore de
tronco escuro a partir da qual a humanidade melhor podia se representar,
trazendo presente na forma de esculturas seus antepassados: o ébano.
Obá,
dessa maneira é a “verdadeira deusa do ébano”, não somente da madeira escura,
de brilho natural que tanto nos representa através das mãos dos artistas
africanos, mas a verdadeira “deusa negra” presente em todas as mulheres, nossas
irmãs e mães que hoje mais do que nunca vão ao enfrentamento para defender a
sua dignidade através da garantia da integridade de seus filhos. Mulheres que
embora tenham conquistado espaços nas sociedades contemporâneas ainda são
aquelas mais estigmatizadas, violentadas e que tem seus direitos menos
respeitados. Mulheres que como Obá amam, e por isso vão a luta pelos seus
sonhos e são capazes não apenas de liderar quilombos, revoltas armadas, greves,
movimentos sociais, mas grupos inteiros pois assim foi desde o inicio quando
Obá saiu á frente convocando todas as mulheres para reconquistar o mundo.
Texto do Prof Vilson Caetano de Souza Junior: Antropólogo, Doutor em Ciênciais Sociais pela PUC-SP e Pós Doutor em Antropologia pela UNESP. Membro do Centro Atabaque de Cultura Negra e Teologia, Grupo de reflexão inter-disciplinar sobre Teologia e cultura fundado no início dos anos 90 em São Paulo. Professor da Escola de Nutrição da UFBA, autor de vários livros na área de Antropologia das Populações Afro-Brasileiras, retirado do site: http://egebeoba.blogspot.com.br/2011/05/oba-lider-das-mulheres-por-prof-vilson.html
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